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Pessimismo de Fé

Porque digo do desleixo de minha alma,
porque, pela preocupação, o descaso me faz supersticioso,
e, nos descasos de meus pensamentos, dói-me perceber-me com sabedoria.
Mas o mal de tal apreciação me faz culpado, por conhecer o mal,
culpado por desentoar o mal.

Como cântico, atiro pedras de pecado em Deus;
como inútil, deliro desprezando uma boa fé,
até que a batalha ainda está na mente — a batalha está na mente —
do final deste mundo para dentro do meu mundo, do meu reino.
Está a pedra fundamental: Jesus Cristo.

E eu preciso de ajuda: minha batalha está na mente.
De todo o meu presente, de todo o meu consciente, respiro amargamente.
Minha intenção não é submissão; minha intenção é toda intenção.
Da minha mente, a fantasia — sim, a fantasia — talvez me abomine.
Minha criatividade não é uma ilusão como passe de mágica; é toda ciência
da qual me conspira a irrealidade.

Sou alguém, pelo preço do pecado, impedido de sonhar, de acreditar;
por amar, impedido de me aproximar; por amar, impedido de experimentar, de ser e de entender as dádivas do desejo, jogado a bolotas no meu cativeiro.
Errado, incompreendido, reprimido, destruído, por um simples debandar do vento da paixão.

Da minha vergonha da nudez ao vexame da prostituição, eu — um porco devorando pérolas — pesando pérolas como se fossem lama.
Mas ainda vivo: se um castigo, apenas deliro e não sei o que digo.

Louco, como podes saber para que lado vai? Cambaleante, entre a esquerda e a direita, não se sabe orientar.
Da paixão, o desejo; da intenção, ser tomado, não tomar.
Melhor dar do que receber; de graça me dou e de graça busco o amor.

Da perdição, em meio às trevas, ilumina-se o labor de todo o meu entendimento, de todo o meu ser.
Ainda assim me entrego: amar a Deus sobre todas as coisas; ainda que falte amor, ainda haverá.
Ainda que eu não veja o próximo, ainda o amarei.

Pois paixão é como sino que tine, e o amor é a dor de todo o meu labor, de toda a minha batalha, da minha mente.
A batalha é na minha mente; ainda assim o fogo do desespero anseia em me queimar,
ainda assim as trevas intentam me cegar e os trovões a me ensurdecer.
Levanto-me sobre a sombra de cada canto, me encanto com um canto: isso vibra, isso me ilumina.
Assim grito ao tempo: de onde vem meu lamento?

Meu lamento vem da verdade, e meu socorro, da eternidade.
Ainda que o vale seja da morte, Deus é minha sorte.
Ainda que eu parta sobre os espinhos, eles apenas me ferirão.
Ainda que ande sobre as rochas, a sola dos meus pés lança os calçados para que pise sobre a cobra; vêm as águias dos céus e a levam embora.

Ainda que caia sobre o caminho, é o meu Guia que me levanta.
Ainda que confies em mim o meu talento, sou eu louco para Te engrandecer, pois meu talento está na verdade: é que sou inútil.

Que ganharia eu para meu Senhor, se não o meu labor?
Ainda que eu trabalhe sobre a boa terra e não tenha talento, me inclinaria a lavar os Teus pés.

Nem só de pão viverá o homem, mas nem só de pão fará em mim o mal da tentação.
Mesmo que se levantem exércitos sobre as galáxias ou os confins da existência, não inclinaria minha cabeça, mas a Deus guardaria.
Minha vida dou não porque quero, mas porque Deus a toma, porque se cumpre toda a vontade de meu Senhor.

Mesmo que me falte palavra, até que a Presença não me cale, eu não estaria a tentar a Deus, pois a Verdade está a me olhar, a me vigiar e a me guardar.
É de Deus que eu venço as tentações.

Mesmo que esteja a gerar, é no tempo de Deus que está todo o meu sofrimento.

Meu Deus Jesus, ateia-me à cruz para que Te siga, para que na verdade eu viva,
não no pessimismo de minhas palavras, mas na vida que busco ao me render diante de Ti.

Porque não há nada que eu faça que Te faça lançar mão de mim, pois se fosse assim eu nem estaria aqui.
Se não fosse pela Tua misericórdia, o que eu seria?